The Distributist Review

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Chesterbelloc e o Distributismo

Gilbert Keith Chesterton (1874-1936) era versado na arte das letras. Além de jornalista, romancista, poeta, crítico literário, ensaísta, polemista, apologista, biógrafo, cartunista e filósofo (e pensarem que esgotamos seus dons, ainda não), Chesterton também trilhou pelo campo da economia.Motivado pela Encíclica Rerum Novarum[note]LEÃO XII. Carta Encíclica Rerum Novarum. Sobre a Condição dos Operários. Publicada em 1891. Confira aqui: www.vatican.va.[/note] (Das Coisas Novas), do Papa Leão XIII, publicada em 1891, que marcou o pensamento da época e foi inspirando a Doutrina Social da Igreja, que apesar de sempre presente no catolicismo ainda não estava sistematizada, Chesterton, desiludido com as falsas esperanças propostas pelo capitalismo e socialismo, juntamente com seu amigo Hilaire Belloc (1870-1953), autor do livro Estado Servil (1912), Chesterton escreveu a respeito: “quando o Sr. Belloc escreveu a respeito do Estado Servil, ele estava apresentando uma teoria econômica tão original que quase ninguém ainda percebeu do que se trata”,[note]G.K. Chesterton, Capítulo "Why I am a Catholic", disponível na obra Twelve Modern Apostles and Their Creeds (1926). Traduzido por Antonio Emilio Angueth de Araujo. Leia mais: www.chestertonbrasil.blogspot.com/.[/note] e também com o apoio do Pe. Vincent Joseph McNabb, desenvolveram uma filosofia econômica conhecida como Distributismo, visto como ‘terceira’ via ao invés do capitalismo e socialismo. Pois, segundo a máxima de Chesterton: "Capitalismo demais não significa capitalistas demais, mas capitalistas de menos."Chesterton e Belloc, ou “ChesterBelloc”, como Bernard Shaw os chamavam, verão de perto as transformações tecnológicas e industriais que a Inglaterra vivenciou ao final do século XIX e início do século XX. As rápidas mudanças do estilo de vida, a poluição, ganância, pobreza e a desestabilidade da família ocasionada pela pobreza, exploração dos menores não deixaram de chamar a atenção de Chesterton, tão zeloso e amoroso com o tema ‘lar’, que remete a família. Ele não se esqueceu que economia também significa ‘administração doméstica’, ‘administração do lar’. Tinha presente que a economia não é uma ciência exata e fria reduzida a dados quantitativos, mas sim humana, pois está atrelada diretamente as nossas relações humanas, devendo, portanto, ser pautadas no respeito à dignidade da pessoa humana e em vista ao bem comum. Pois, afinal, o princípio e fim de tudo estão na transcendência.Para Chesterton tudo começa na família, no lar. Fantástico mundo da criança, primeiro contato dela com a realidade. Ele via claramente o perigo da sociedade capitalista monopolista: “Um inimigo ainda mais feroz da família é a fábrica. Entre estas coisas mecânicas modernas a instituição natural antiga não está sendo reformada, modificada ou mesmo podada: ela está sendo dilacerada. E ela não está sendo dilacerada no sentido de uma metáfora verdadeira, como a de um ser vivo preso em uma engrenagem medonha de uma máquina. Ela está sendo, literalmente, rasgada ao meio, como quando o marido vai para uma fábrica, a esposa para outra, e a criança para uma terceira. Cada um deles se torna o servo de um grupo financeiro diferente, que cada vez mais ganha o poder político de um grupo feudal. Mas enquanto o feudalismo recebia a lealdade das famílias, os senhores do novo estado servil recebem apenas a lealdade de indivíduos, ou seja, de homens solitários e até mesmo de crianças perdidas.”[note]G.K. Chesterton, The Superstition of Divorce. Capítulo A história da família. Tradução: Carlos Ramalhete. Confira aqui: www.chestertonbrasil.blogspot.com.[/note]O sistema capitalista monopolista afronta e embrutece o homem o tornando escravo do materialismo, pelo contrário, o socialismo, também materialista, com seu falso messianismos, propõe a felicidade ao homem aqui na terra com a simples mudança do sistema econômico e sua ‘distribuição’, que na verdade é a posse por parte do Estado—que, diga-se de passagem, não é uma entidade sobrenatural—da propriedade privada, não oferecendo soluções concretas para o problema da má distribuição da propriedade e o bem comum. Chesterton via claramente os dois sistemas e seus respectivos erros.Dócil ao ensinamento do Magistério da Igreja, responde Chesterton e Belloc ao momento conjuntural complexo da Inglaterra com a teoria distributivista. Teoria essa que rapidamente começou a ganhar admiradores. Chesterton e Belloc criaram então a Liga Distributivista. O objetivo da Liga era “restaurar a propriedade”, segundo pronunciou Chesterton no discurso inaugural. Chesterton foi eleito o primeiro presidente da Liga. Ele escreveu uma série de artigos sobre sua teoria no G.K.’s Weekly, os quais foram compilados no livro The Outline of Sanity (1926).”Podemos ver claramente a influência das idéias distributivistas na obra O Senhor dos Anéis (escrito entre 1937 e 1949), de J.R.R. Tolkien, segundo Matthew P. Akers: “Tolkien inclui soluções distributivistas para os problema associados com o desenvolvimento econômico em sua trilogia. O Condado, lar dos Hobbits, sofre muitos dos problemas de nossa sociedade moderna, em particular uma crise econômica, a destruição de seu meio ambiente e a tentação do imperialismo. Examinemos, pois, como os Hobbits do Condado aplicam os princípios distributivistas a esses problemas para ver como poderíamos tratar esses mesmo problema em nossa sociedade”.[note]Matthew P. Akers. Publicado na revista Distributims Review. "El Distributismo en la Comarca." Tradução : Alfonso Díaz Vera. http://www.distributistreview.com/el-distributismo-en-la-comarca/.[/note] Infelizmente o filme dirigido por Peter Jackson não reproduz muito bem essas passagens da obra.O Distributismo, basicamente, possui como bases três fundamentos presentes na Doutrina Social da Igreja: Propriedade Privada, princípio da Solidariedade e princípio da Subsidiariedade. Explicamos cada um deles:O primeiro e mais importante princípio do distributimo é o da Propriedade Privada. Para Chesterton a propriedade privada era sagrada. No universo de uma propriedade, pois a propriedade é “um território circunscrito em que ele [o homem] é rei”. Pois assim Chesterton defendia que “a propriedade privada deve ser distribuída com suficiente e decente igualdade”. Pois, como nos é lembrado por Leão XII, a propriedade “é de direito natural para o homem: o exercício deste direito é coisa não só permitida, sobretudo a quem vive em sociedade, mas ainda absolutamente necessária” (12), afinal “não é das leis humanas, mas da natureza, que emana o direito de propriedade individual” (28). Todos os homens possuem, portanto, direito a uma propriedade. Isso é imprescindível para sua dignidade como pessoa, afinal, Deus deu a terra para que o homem a dominasse e não para que os homens dominassem, no extremo oposto ao sentido de dominar cristão, uns aos outros.O tema propriedade privada terá tanta importância para Chesterton que em diversos artigos encontramos cometário a respeito do tema. Em um capítulo do livro The Well and the Shallows (1935) intitulado "Sex and Property", Chesterton nos alerta para o risco de não usufruirmos bem da propriedade “a noção de reduzir a propriedade ao mero fruir do dinheiro é idêntica à noção de reduzir o amor ao simples gozo do sexo.”O segundo fundamento é o Princípio da Solidariedade que propõe, segundo Don Pedro Jiménez, em seu artigo, Sobre el distributismo,[note]Don Pedro Jiménez de León. "Sobre el Distributismo," artigo publicado na Distributism Review. Confira aqui: http://www.distributistreview.com/sobre-el-distributismo/.[/note] que aqui “não nos referimos a solidariedade vã e falsa, mas sim uma muito profunda, que seria melhor chamada de caridade.” Pois, “o Estado deve trabalhar de maneira subsidiaria para o bem comum de cada comunidade. Não importa se perde eficiência em muitas coisas, o importante é trabalhar para e pelo bem comum, ou seja, tomar aquelas medidas que promovam a virtude entre as pessoas e dessa maneira a sua felicidade.”Por fim o terceiro pilar da teoria é o Princípio da Subsidiariedade que propõe, também segundo Don Pedro Jiménez, “dito de uma maneira simples, que o que possa fazer uma entidade pequena não faça uma entidade grande. A entidade menor é o indivíduo, assim é que aquelas coisas que possam fazer o indivíduo não o faça as grandes empresas. O princípio de subsidiariedade deveria reger tanto na face econômica quanto política. Este princípio é básico e fundamental para o funcionamento de um sistema distributivista.”Ultrapassa minhas limitadas capacidades aprofundar mais sobre o Distributismo. Fica o convite para que conheçamos mais profundamente no estudo e aplicação da Doutrina Social da Igreja. Fica, também, o convite de Chesterton para conhecermos mais sobre o Distributismo. Concluímos com um trecho do excelente (e recomendado) artigo do Padre Ian Boyd, uma das (eu creio que A) maiores autoridades sobre Chesterton no mundo, "El distributismo y la crisis cultural," a respeito do pensamento social de Chesterton: “O pensamento social de Chesterton está baseado na convicção de que Deus, que é a realidade última, está presente na sociedade e história do homem.”